Imagem: Melancholy (Melancolia), de Edvard Munch (1891)
Introdução
Para o autor de "A Essência do Cristianismo", o conhecimento que o homem tem de D'us é apenas o conceito de si mesmo e de sua própria essência. A partir desta perspectiva, Feuerbach realiza uma redução total da teologia e da filosofia à antropologia, uma vez que o "Ser absoluto- o D'us dos Homens", se mostra como a essência do próprio homem. Logo, a alienação religiosa consiste em tornar D'us algo que, na verdade, é a expressão do próprio homem.
Método de Observação e Análise de Feuerbach
O método de observação e análise de Feuerbach é inteiramente objetivo. Segue o mesmo percurso da química analítica, por isso são apresentados esparsamente, quando possíveis e necessários, alguns documentos, logo abaixo de seus textos, ora, numa espécie de apêndice especial, a fim de legitimar as conclusões de sua análise.
Na pg. 13 do capítulo 1 de "A Essência do Cristianismo", Feuerbach enfatiza que irá "demonstrar de forma objetiva seus resultados, e não se incomodará se alguns, ponderarem seus métodos chocantes ou ilegítimos. Ele insiste em pontuar sua metodologia como objetiva.
Objetivos de Feuerbach em A Essência do Cristianismo
Para o Filósofo, esta obra, jamais pretendeu uma análise empírica ou histórico-filosófica, ou mesmo, uma solução para o enigma da religião cristã. Segundo ele, os princípios gerais que apresenta na Introdução não são- a priori - forjados, nem mesmo produtos de mera especulação.
O autor sustenta que todos os princípios surgiram de uma análise religiosa e observação da consciência humana, traduzidas para ideias racionais, a partir de expressões gerais, e todas concebidas pelo entendimento. Ele insiste que suas ideias são conclusões de premissas, e não meros pensamentos, i.e., fatos objetivos, atuais e históricos¹.
Principais Citações de Feuerbach - Prefácio à Primeira Edição
A Gênese e Fundamentos da Obra
"Neste livro não se tornam as imagens da religião nem pensamentos - pelo menos no sentido da filosofia especulativa da religião
- nem realidades, mas são consideradas como imagens, i.e., a teologia não é tratada nem como uma pragmatologia mística, como o é pela pela mitologia cristã; nem como ontologia, como
o é pela filosofia especulativa da religião, mas como uma patologia psíquica". (p.13).
“Os princípios gerais que eu apresento na introdução não são a priori forjados, produtos da especulação;
surgiram com a análise da religião, são apenas, como em geral os pensamentos fundamentais do livro, exteriorizações reais da essência humana (na verdade, da essência religiosa
e da consciência humana) traduzidas para ideias racionais, isto é, concebidas em expressões gerais e por isso trazidas ao entendimento. As ideias do meu livro são apenas conclusões de premissas
que não são meros pensamentos, e sim fatos objetivos, atuais ou históricos - fatos que apesar da sua existência bruta em incunábulos não tinham absolutamente lugar em minha cabeça.”
(p.20).
“Certamente é esta minha obra negativa, mas (note-se bem!) negativa somente quanto à essência não humana, não quanto à essência humana da
religião. Por isso divide-se ela em duas partes das quais, conforme a importância, é a primeira afirmativa, a segunda (incluindo o apêndice) negativa, não totalmente, mas em sua maior parte;
em ambas, porém é demonstrada a mesma coisa, apenas de modo diverso ou mesmo oposto. (p.23)
“Minha obra contém, disse eu acima, o princípio desenvolvido in concreto de uma filosofia nova, não fiel a uma escola, mas ao homem. Sim, ela o contém, mas
somente enquanto ela o gera e o gera no ventre da religião - por isso, diga-se de passagem, a filosofia atual não mais poderá cair e não mais cairá na tentação de demonstrar
a sua coerência com a religião através da sua coerência com o dogma cristão, como tentaram a antiga escolástica católica e a atual protestante; antes, por ser gerada na essência
da religião, tem a verdadeira essência da religião em si, é em si e por si, enquanto filosofia, religião". (p.28)
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A Essência do Homem em geral
Paintings - Salvador Dali - Fonte Imagem: https://www.wikiart.org/pt/salvador-dali
Tese: A Essência do Homem em Geral: Consciência, a Vontade e o coração.
Essas são as diferenças essenciais entre os homens e os animais (p.36). Esses elementos fundamentais de sua essência, o homem não produz, e nem possui, mas está ligado à sua objetiva.
(p.38, 39). Essa essência permite a pratica da religião. Os animais não têm religião. D’us é a própria essência. (p.35, 38).
“De fato é o animal objeto para si mesmo como indivíduo - por isso tem ele sentimento de si mesmo - mas não como gênero - por isso falta-lhe
a consciência, cujo nome deriva de saber.” (p.35)
“Por isso toma a homem consciência de si mesmo através do objeto: a consciência do objeto é a consciência que o homem tem de si mesmo.
Através do objeto conheces o homem; nele a sua essência te aparece; o objeto é a sua essência revelada, o seu Eu verdadeiro, objetivo. E isto não é válido somente para os objetos
espirituais, mas também para os sensoriais”. (p.38)
“Por isso tem o animal apenas uma vida simples, mas o homem uma dupla: no animal é a vida interior idêntica à exterior - o homem possui uma vida interior
e uma exterior. A vida interior do homem é a vida relacionada com o seu gênero, com a sua essência. O homem pensa, isto é, ele conversa, fala consigo mesmo. O animal não pode exercer nenhuma função de gênero sem
outro indivíduo fora dele; mas o homem pode exercer a função de gênero do pensar, do falar (porque pensar e falar são legítimas funções de gênero) sem necessidade
de outro.
O homem é para si ao mesmo tempo eu e tu; ele pode se colocar no lugar do outro exatamente porque o seu gênero, a sua essência, não somente a sua individualidade, é para ele objeto. A essência do homem, em contraste com a do animal, não é apenas o fundamento, mas também o objeto da religião.” (p.36)
“O ser absoluto', o D'us do homem é a sua própria essência. O poder do objeto sobre ele é, portanto, o poder
da sua própria essência. Assim, é o poder do objeto do sentimento o poder do sentimento, o poder do objeto da razão o poder da própria razão, o poder do objeto da vontade o poder da
vontade. (p.38).
Conclusão
Nesta síntese aplicada, percebemos o filósofo apresentando ideias pouco convencionais, inclusive desconsideradas pela tradição cristã e muitos empiristas. Contudo, Feuerbach se revelou em sua geração como um filósofo lúcido e atento a todo debate que se desenrolou em sua ápoca, mantendo ciência a respeito da complexidade dos problemas que visava enfrentar.
Feuerbach influenciou figuras como Marx, Kierkegaard, Dussel, Freud, Debord, Cioran e Girard. Como crítico severo, ele percebe a impossibilidade da manutenção do cristianismo ao perceber que a própria cristandade deturpou o sentido primário do ser cristão, influenciando, inclusive, uma prática de um falso cristianismo.
Adiante, apontou de forma clara em sua tese, que a cristandade inverteu o sentido de ser cristão, naturalizando em seu meio toda forma de mundanismo. Finalmente, Feuerbach alega que atacou a filosofia especulativa em seu ponto fraco: "point d'honneur", ao destruir impiedosamente a aparente concórdia que fora estabelecida na modernidade entre a filosofia e a religião.
Em sua tese, pôde demonstrar e comprovar, que a filosofia retirou a religião do seu estado verdadeiro e essencial, e, em concordância com o zeitgeist², elevou-a para um lugar de idolatria. Essa estratégia, violentou a Essência do Cristianismo Original. Desta forma, Feuerbach condenou a chamada filosofia positiva, chamando-a de "fatal".
Por meio desta provocação para demonstrar que o original do seu ídolo é o homem; e que haja personalidade, é preciso então, carne e osso - em termos finais: o homem em busca de sua essência cria deuses!
Prometeu e a Criação do Homem - Mitologia Grega - Imagem by Mike Azevedo/Superinteressante
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Até o próximo post!
Chris Viana
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Referências
FEUERBACH, L. A Essência do Cristianismo. Trad. José da Silva Brandão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
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Notas
¹- Vide Prefácio Segunda Edição, p. 28; § 2.
² - Zeitgeist é um termo alemão cuja tradução significa espírito da época, espírito do tempo ou sinal dos tempos.
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