A Essência do Amor como o Des-velar de todo o Existir

Sendo o amor o maior dos dons ele é o Des-velar do Existir


 


“Só o homem existe, enquanto modo característico de estar no mundo, ao passo que as coisas simplesmente são." "O ente cuja análise é nossa incumbência somos nós mesmos. O ser deste ente é em cada caso meu. No ser deste ente comporta-se ele relativamente ao seu ser.” (Heidegger, 1976)


Se pudéssemos prever o dia de nosso nascimento e a hora de nosso último suspiro, faria alguma diferença nas nossas supostas escolhas?

Muitas pessoas se arrependem ao longo de sua existência de muitas atitudes e escolhas. Chegam a dizer, se puderem ter outra vida, querem fazer tudo diferente.

Algumas não. Ainda que reconheçam que nem tudo é belo e bom, alegam que jamais fariam diferente.

De forma em geral, espera-se que uma existência recheada de fartura, alegria, conforto e conquistas, seja o modelo de felicidade. Para alguns, a miséria, a fome, a doença e outros labores, são sinônimos de uma vida infeliz.

Mas o que me chama atenção neste momento é exatamente o paradoxo da questão. 

Porque existem pessoas que tem “tudo” e são infelizes e outras, que jazem na escassez e privação e são tão felizes?

O conceito de felicidade é distinto em algumas fontes de saber, tais como a psicologia, filosofia e religiões. O ponto comum entre esses conceitos é o que as remonta como bem-estar e espiritual ou mesmo, paz de espírito.

Para os gregos antigos, sempre foi desafiador estabelecer um conceito para a felicidade. Para os filósofos da antiguidade que dedicaram a definir sua natureza e que tipo de comportamento ou estilo de vida levaria à felicidade plena.

O termo eudaimonia era utilizado em questões éticas, mas para conotar as emoções associadas à felicidade, utilizavam o termo prazer. A eudaimonia precisava ter caráter deliberativo, e não utilitarista.

Para o filósofo grego Aristóteles, que viveu no século IV a.C., a felicidade é uma atividade de acordo com o que há de melhor no homem. Este, dotado de razão, ao realizar suas atividades deliberadamente de forma virtuosa, encontrará satisfação e paz de espirito.

Nem todo pensamento filosófico antigo tem é uníssono. Para Epicuro (Sec. IV e III a.C.), a melhor maneira de alcançar a felicidade é através da satisfação dos desejos de uma forma equilibrada, que não perturbe a tranquilidade do indivíduo.

Outro filósofo grego, contemporâneo a Epicuro era, Pirro de Élis. Ele advogava que a felicidade residia na tranquilidade, porém divergia quanto à forma de se alcançar a tranquilidade. Segundo Élis, a tranquilidade viria do reconhecimento da impossibilidade de se fazer um julgamento válido sobre a realidade do mundo.

Os Estóicos, também defendiam a tranquilidade (ataraxia) como o meio de se alcançar a felicidade, e isso era possível através do autocontrole e da aceitação do destino.


Jesus Cristo, defendeu o princípio do amor como o elemento fundamental para se atingir a harmonia em todos os níveis, inclusive no nível da felicidade individual. Sua doutrina ficou conhecida como cristianismo.

Contudo, o cristianismo medieval, moderno e pós modernidade, muito se afastou do conceito original. Para a teologia do primeiro século, o amor era expresso de várias formas e intenções. Sendo o único deliberativo e eterno, o Amor Agape.

Como nossa intenção não é traçar um panorama histórico do conceito de felicidade nos atearemos a esta até aqui e seguiremos a nossa reflexão. O que a felicidade tem a ver com nosso questionamento introdutório?

Na Primeira Epístola ao Coríntios, no capítulo 13, o apostolo Paulo, parece se preocupar com essa questão tão próxima de nossos irmãos recém atravessados pelo evangelho de Cristo. Ele diz: 

“Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o sino que ressoa ou como o prato que retine. Ainda que eu tenha o dom de profecia e saiba todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé capaz de mover montanhas, mas não tiver amor, nada serei. Ainda que eu dê aos pobres tudo o que possuo e entregue o meu corpo para ser queimado, mas não tiver amor, nada disso me valerá. O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor. O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor nunca perece; mas as profecias desaparecerão, as línguas cessarão, o conhecimento passará. Pois em parte conhecemos e em parte profetizamos; quando, porém, vier o que é perfeito, o que é imperfeito desaparecerá. Quando eu era menino, falava como menino, pensava como menino e raciocinava como menino. Quando me tornei homem, deixei para trás as coisas de menino. Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então, conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido. Assim, permanecem agora estes três: a fé, a esperança e o amor. O maior deles, porém, é o amor”. (NVI).

Essa é a maior expressão de amor de forma generalizada a todos os homens, amor este, vindo do Criador em direção a sua Criatura, expresso nas Escrituras.

Em cantares, a expressão amor, atinge seu ápice lírico, no canto do noivo à sua noiva, mas esse amor, diferente do Agape, é o Eros, condicionado à forma humana e seus desejos.

Algumas pessoas passam a vida sem amor. Vida é como eu me coloco diante das coisas? 

Como sou afetado e afeto o mundo circundante? Qual via é acessível à minha percepção do existir? Como tomo nota, como experimento o que é percebido ou revelado a mim?

Essas e outras indagações nos permite situarmos frente ao desafio do “viver” e percebermos que a experiência da vida sucede de acordo com o modo que concebo esse viver, isto é, como as coisas tendem e significam.

A experiência parece nos lançar a margem de constantes contingências que anelam nosso existir. Essa experiência anela nossa consciência histórica. Ou seja, o que surge - torna-se - e isso, ocorre no tempo. 

No tempo, tenho encontro à realidade das coisas. Sendo tempo duração, o existir que se inicia no fato de ser-no-mundo, ao término desse lugar singular, se remontará, à muitas experiências surgidas, afetadas ou não por mim e pelos outros.

São nos fenômenos da existência que lançamos à margem o que se revela a nós. Seja para esquivarmos, enfrentarmos, assimilarmos, ressignificá-los, ou mesmo, aceita-los.

O sentido que dou à vida implicará direto nas minhas escolhas. Nosso texto bíblico revela isso. De forma poética, mas objetiva, Paulo nos revela o fato de que o atravessar e ser atravessado pelo amor nos afeta de modo tal, que temos uma mudança radical de caráter.


Observe que ele menciona que poderíamos ter tudo, até mesmo dons sobrenaturais, bens, atitudes. Mas sem o amor deliberativo e voluntário, afetado pelo amor do Criador, seríamos como metal que soa e retine, situações que chegam a chamar atenção, mas não afetar integralmente. Sem valor!

Nesse lugar chamado vida, ao longo de sua duração, temos a escolha do existir. Muitos estão preocupados em viver alopradamente ou intensamente, outros não veem sentido por conta de sua temporalidade e extinção do corpo.

Alguns pensam tanto no porvir, que esquecem de existir aqui-agora. São dois extremos que nos afastam do verdadeiro sentido do viver.

Desde o dia que abrimos nossos olhos iniciamos uma jornada de aventura à vida. Num dado período, sem cuidados e afetos necessários, jamais alcançaríamos o mérito de um possível compreender estar vivo.

Mas ao longo da duração, frente às contingencias que se instalam, somos inseridos em um mundo circundante. Neste mundo a duração já se faz presente. Ao nos depararmos com os desafios de nosso próprio mundo intercalado no mundo circundante, as múltiplas possibilidades se instalam em nosso próprio existir, enquanto ser-no-mundo.

Nesse tear entre o existir e a duração, a história se faz. A vida fática - vivida - se eterniza. 

Logo, cada dia soa como oportuno e eficaz para o complementar dessa jornada histórica. Em nossa consciência, empregadas com letras da experiência, a existência é marcada a cada instante. 

Voltamos no tempo o quanto desejamos, e projetamos o incerto naquilo que esperamos.

Nessa miscelânea incerta, o desejo de compreender nos torna discípulos de um saber que se instala a cada manha nesse universo que se mostra, que se desvela a cada um de nós.

Para isso, é necessário ao homem o contemplar a luz. A luz do conhecimento que abre seus olhos e ilumina seus passos. A luz da chama do amor.

Sendo a existência fruto do amor do Criador, resta-nos a e a esperança nesse amor, para que um dia venhamos contemplar a face que hoje nos é como enigma, e finalmente conheceremos o que nos é oculto pelo corpo que se distrai com coisas que não podem ser eternizadas.

Os gregos estavam certos de muitas coisas. Mas uma vida virtuosa ou privativa, não é suficiente para o ser-no-mundo alcançar sua plenitude. Certo de que as escolhas nos afetam sempre, propomos um novo despertar.

Não apenas para a práxis da caridade ou religiosidade vazias e utilitárias. Mas a um olhar transcendente sobre algo que precisa ser deliberativo, voluntário, no tempo da duração.

Somente um homem que se conhece e se ama, pode amar alguém e claro, contemplar a D’us!

D’us é amor. Um amor que se concentra em doar pela sua misericórdia e justiça. D’us jamais doa livre dessas duas balanças. Muitos se perdem ai! É deliberativo, mas conhece o coração, e conhece a cada um os seus planos mais ocultos.

Por isso o des-velar o coração, consiste num exercício contínuo de se conhecer. É preciso experienciar a vida, e na vida fática, o histórico apresenta as bases dessa revelação.

Cristo foi o maior exemplo deliberativo entre os homens, Se entregou deliberadamente por nos amar. Foi afetado por nossas transgressões e humilhados pelas nossas escolhas.

Não julgou. Apenas existiu. Faticamente cumpriu a sua jornada e nos amou até o fim. Nele temos o caminho como exemplo de fé e esperança. Fé no ser humano e esperança que estes O reconhecessem como o Bon Ami.

Tenho certeza que não mudaria um dia de sua trágica história.

E você? Sua vida tem um sentido? O que lhe falta?

Uma coisa é certa: ninguém poderá viver além de sua própria vida e sua própria morte. Logo, nos resta apenas, escrevermos nossa própria história com as penas que nos compete o existir.

Certamente eu não faria outra escolha, a não ser estar aqui-agora sendo afetada pelo amor que me une a vocês.

Da amiga de sempre,
Christianne Sturzeneker
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