POSSESSÃO DEMONÍACA A LUZ DA FENOMENOLOGIA E PSICOPATOLOGIA

Em tempos antigos, a possessão era compreendida como estar em posse de algo demoníaco. Era manifestada de forma isolada ou mesmo, a partir de epidemias de possessões. Hoje, apesar desse comportamento ser compreendido pela psicopatologia como um transtorno, os  fenômenos de possessão, pode ser compreendido a partir de outras perspectivas, tais como, behaviorista, psicanalítica, espiritística e fenomenológica.


Ao finalizar o ensaio "Magia na Antiguidade e Modernidade", anunciei este post como um epílogo. Nas próximas linhas, descreverei, parte da história da possessão e sua  descrição medieval como uma expressão do ser de origem demoníaca, razão esta que se abre para muitos modos de compreensão, investigações  e hipóteses.

Nosso espaço é pequeno, como não pretendemos esgotar a narrativa, muito menos reduzir o assunto à nossa perspectiva, estaremos abrindo a questão para possíveis comentários e pontos de vista. Nosso Blogger é um espaço aberto ao conhecer, que, hipoteticamente, se expande nas pluri-formas de ser. Sendo assim, alguns pontos poderão apresentar contextos paradoxais, críticos, e por que não, discordantes?

Na contemporaneidade, a crença no diabo fica a encargo de algumas religiões e seitas. Em sua vasta razão, acreditar no diabo remonta à ignorância, incompreensibilidade conceitual, incompreensível preconceito. Mesmo teólogos, evitam abordar a hipótese demoníaca e falam cada vez menos sobre a possibilidade de um real inferno.

Em 1955, escrevendo acerca do satanismo, Jules Bois, inspirado em Baudelare, ironizou em seu tratado que Satã encontrou imprevisto em seu estratagema - o de negar-se a si mesmo, de negar Satã, do mesmo modo que nega D'us:

"A mais bela artimanha do diabo é persuadir de que ele não existe" 
(Citação de Guimarães Rosa em "Grandes Sertões, Veredas - de Baudelaire)

"Esboça sorrisos superiores de sábio e de lógico, quando lhe falais do diabo. Tudo isso não é mais do que superstição , boa gente! A ciência venceu esse fantasma do obscurantismo e dos misticismos. O supremo esforço do diabo, desse luminoso místico contemporâneo, foi o de chegar à perfeita hipocrisia de proclamar que o diabo não existe!"

E Bois continua:

"Satã Pai é, pois, o Satã das profanações, dos malefícios, das missas negras, dos sortilégios, do amor desenfreado, dos assassinatos sacrílegos, o senhor das larvas envenenadas, o Amo da necromancia abjeta, o que sorve sêmen e sangue - o deus de Gilles de Rais¹, dos sacerdotes infames, dos trites viciosos, dos pervertidos fraudulentos, das mulheres já condenadas ao tédio pela ausência de toda fé²."


A PANDEMIA DIABÓLICA - ORIGENS DAS POSSESSÕES

Quadro Renascentista - As Fúrias

No século XIII, uma pandemia diabólica na Europa medieval deu início ao primeiro julgamento contra a bruxaria, sob os auspício da Inquisição. O bispo de Toulose condenou à fogueira às mulheres que confessavam ¨ter relações sexuais com o diabo" e alimentá-lo com "carne de criancinhas" (Szolt, 1967).

Lanceli (1903), antropólogo e estudioso medieval escreveu:

"Quem pretendesse negar um fato de possessão demoníaca, deveria ser considerado possesso!"

A maioria dos fenômenos medievais, sejam os considerados parapsicológicos e mesmo os científicos, eram descritos como possessão demoníaca sem qualquer contradição. Os que intentavam compreender de outra forma ou método, eram perseguidos, senão, executados.

As confissões tinham mais efeitos do que fatos. Uma mulher bruxa, confessou ter tirado o corpo de uma criança do cemitério. (Vejam artigo "Crianças Bruxas" nesse Blogger). Contudo, ao certificarem a questão, descobriram que o corpo da criança estava no cemitério. Ainda assim, os juízes decidiram que o cadáver era uma "ilusão diabólica", e a mulher foi queimada (Gineste, 1978).

Neste mesmo autor, temos a narrativa de um processo contra certo Gaufrid, acusado de bruxaria por duas freiras em Aix. Sem argumentos contra a histeria do convento, o homem declarou-se culpado, confessou um pacto com o diabo, disse ter frequentado o Sabá e que tudo isso foi sobre influência feminina. Outra figura queimada nesta época foi o famoso Urbano Grandier.

A saga não pára por aqui. Wierus (Johanes Wier), em "De Prestigius" (Bale, 1568), discípulo do mago Cornélius Agripa, com disfarçada ironia, estipulou o número de diabos em 7.405.926, distribuídos em 1.111 legiões, com 6.666 demônios, chefiados por 72 príncipes, entre os quais se destacam: Asmodeu, Abbadom, Belial, Baalberit, Behemoth, Beelzebub, Leviathan, Luzbel, Lucifér, etc. (RISCO, STRAUSS, 1967). 

No atual "Dicionário Infernal" republicado em 2010 pela portuguesa Cavalo de Ferro, conferem-se essas narrativas. Homens eminentes acreditavam sinceramente no demônio!


De acordo com estatísticas do século XIX, cerca de 3.000 mulheres. Um caso bem marcante nesse relato foi de Catarina, uma jovem mulher, que ao cozinhar, assoprou a lenha, e fagulhas caiu nos rosto de uma colega grávida de nove meses. Logo após, ao entrar em trabalho de parto, a companheira acusou Catarina que foi condenada a morrer na fogueira como feiticeira.

Um outro caso foi uma mulher que passou sobre uma janela onde uma criança tentava pegar um ninho de passarinho. A criança perdeu o equilíbrio e caiu. A mulher, queimada viva!

Dentre as mulheres acusadas de bruxaria, estavam as prostitutas, os lobisomens, os zoofilistas e os bebedores de suco de maçã. Sim! Eu disse isso! Suco de Maçã! Por ser considerada o fruto de Eva, era diabólico! O mais curioso ainda era que, com o aumento da perseguição, o número de possessos, lobisomens e bruxas só aumentavam ao invés de diminuir!

O caso é que os "feiticeiros e bruxos" da Picardia, nos séculos XVI a XVII, afirmavam a mesma coisa com os mesmos pormenores, apesar de analfabetos, ignorantes e nem se conhecerem. O diabo parece igual nesse século!!! E em todos os lugares! Nunca na história da humanidade, o diabo tomou tal proporção, embora tenha sido citado inúmeras vezes em outros livros, inclusive pela Bíblia Cristã.

Em todos os povos da antiguidade, entidades maléficas, torvas, eram descritas em suas narrativas e conhecidas pela essência de maldade, mas não como o Satã medieval. Acredita-se que suas fontes foram retiradas do livro de Isaías (Cap. 2, 12 e 14); de Jó, do Apócrifo de Enoch e do Apocalipse. 

Podemos explicar que teólogos, rudes, castos, fanáticos, antepuseram a D'us, o diabo, autor das ditas infâmias e luxúrias. Podem ter feito dessa maneira, ao seguir o manual das "Controvérsias Mágicas", onde arrancavam pela tortura e perguntas direcionadas, as confissões forçadas e condizentes ao seu sadismo.

Insensivelmente, o efeito foi se tornando causa. O interrogatório preconcebido levava cada acusado à um único lugar: em direção a uma teoria proposta fundamentada na interpretação o e confirmaram infundada dos livros sagrados. Em suma, inventaram o diabo e confirmaram sua existência, pelas confissões forçadas, mas acabaram por pensar o contrário - que foram as confissões que os levaram a concluir pela existência do diabo.

A GÊNESE DE UMA DEMONOMANIA COLETIVA

            Xilogravura Livro: Demonomania de gli Stregoni, 1590. Ed. Latim. Acervo próprio

Em 1861, Morzine da Sabóia propõe uma demonomania. Ele descreve em sua obra que uma certa menina de 10 anos, chamada Tavernier, ao ver o corpo de uma amiga sendo retirado das águas, quase afogada, cai em letargia. Após um tempo, mais quatro pessoas, caem em convulsão e passam a emitir o fenômeno de "falar, responder, interpretar e predizer auguro em línguas estranhas".

Algumas dessas predições se realizavam. Em estado de possessão, essas pessoas tinham maior habilidade para subir em árvores, desdobrarem, correrem, mas ao voltarem a si, sequer lembravam-se dos seus comportamentos emitidos. Esses eram os velhos e clássicos episódios de endemoninhamento. 

Pela exigência do cura  de Morzine, nos alpes franceses, 27 pessoas consideradas possessas foram examinadas, postas em isolamento em 1861. Entretanto, o número de "doentes" aumentou. Os que duvidavam das possessões, passaram a ser acusados de "disseminadores do mal". Em meio a tanto fanatismo e ignorância, e à excessiva credulidade, as possíveis psicoses coletivas eram vistas como assustadoras, mas também como experiência de vastidão³.

OS EXORCISMOS

Em Villefrance, 1908, certo homem durante o exorcismo, é levantado cerca de cinco metros , até o teto. Desce lentamente por ordem do padre. No segundo exorcismo, sai do seu corpo uma enorme serpente, de olhar flamejante e fixo, que sai pela janela, com um silvo terrível.

Eu particularmente diria que se trata de mera fabulação, se não tivesse passado pela experiência tanto no Brasil como no Continente Africano, na ocasião em que liderava um Ministério de Libertação. Na cidade de Linhares - ES, em 2014, fui chamada em meu escritório para uma sessão de "libertação". No local, haviam cinco pessoas de crenças diferentes, tentando "exorcizar" uma mulher adulta, cerca de 40 e poucos anos, após retirá-la de uma forca no seu próprio quintal. 

De acordo com as testemunhas locais, pastor Genilson de uma Igreja Pentecostal próxima a residência da mulher, Maria, cunhada da mesma, Maria da Penha, membro da Igreja Presbiteriana e João, católico carismático, "X", estava intentando contra sua vida, após ouvir o demônio ordenar seu enforcamento. Não era a primeira intenção. Fora levada ao CAPS-Linhares, mas sem prévio diagnóstico, recebeu alta. Nessa quinta tentativa, o filho conseguiu salvá-la da forca por pouco (Todos nomes próprios acima são pseudônimos).

Correu para chamar a tia, e esta foi chamando os vizinhos que poderiam, segundo a sua percepção, ajudar "X" a se libertar. Eu estava com minha equipe MICAI para treinamento em Campo. Segui para o Local com a Renata Cristiana, minha fiel escudeira na época, e ao chegarmos no local, me deparei com "X" agarrada nas frechas da parede. Me assustei! Era a primeira vez ao vivo!

Ao nos aproximarmos do grupo, observei que jogavam água benta e óleo ungido, símbolos de selamento ou unguento, isto é, estavam cercando o local na simbologia espiritual. Pedi que parassem por um momento e que apenas um de nós fosse outorgado como autoridade para o exorcismo. Como eu era a mais experiente, a concessão foi unânime.

Perguntei pelo seu nome e pedi que ela descesse. Ela urrava assustadoramente e dizia: Você não!!!! Eu perguntei se ela me conhecia. Respondeu que sim, e que eu estava atrapalhando o "trabalho dele"!. Eu perguntei que trabalho: "Ele (se apresentava como ele), disse: tirar vidas! Perguntei novamente seu nome: Respondeu: Lancelot!

Após isso, orientei que os "expectadores" se afastassem e ordenei que "Lancelot" saísse da parede. Pulou em minha direção, sem me tocar, subiu em um sofá. Eu disse: Cadê o Livro? (Não me perguntem como eu sabia!) Ele rugiu e gritou: Você nunca achará!!!! 

Saiu correndo em direção a corda na árvore! Deixei que ela subisse na cadeira e com uma faca, cortei o nó embaixo da árvore. Ela caiu! Enquanto estava desmaiada (Renata é enfermeira e eu possuo treinamento médico emergencial para primeiros socorros), pedi que o filho se direcionasse a um esconderijo, que de forma maravilhosa pude "ver" e lá achei um livro atribuído a São Cipriano, mas alguns pembas. Peguei os objetos, segui para fora, e pus ao lado de "X" para as esconjurações. 

Não me envaideço, sinto-me honrada pelo dom que nos foi outorgado, mas "X" se restabeleceu. Foi diagnosticada com uma esquizofrenia grave, está ainda em tratamento nos dias de hoje. Certa de que não esgoto a questão sobre a diferença entre possessão e psicose, meu intuito é demonstrar nesse espaço, que temos abertura para a dimensão metapsíquica (casos possessão) e também, enquanto profissional de saúde mental, as questões orgânicas, psicológicas e psicofísicas.

Poderia ainda, aproveitar e relembrar nosso caso de exorcismo na África, narrado em artigo anterior. Mas avancemos!!!

Janet Hogdson - Possessão real em 1980 - Inglaterra

Voltando ao nosso pesquisador, em 1910, uma jovem chamada Dolores Campagne, com 14 anos na época, enviou uma carta ao cardeal da França, alegando que era perseguida pelo demônio, que lhe lançava pedra, garrafas, petróleo, etc., durante o dia e noite na presença de outras pessoas.Certa vez, ao ser levada a delegacia local, um policial debochou da situação dizendo: "Espero que as garrafas não caiam agora!". Sete garrafas caíram aos pés da menina, depois moedas. 

Em 1817, em Cazouls, na residência do padre Juline, o Dr. Béziers e mais sete pessoas, vira Marie-Ange em êxtase e ouviram os beijos que soavam de sua boca. Cada beijo produzia em sua boca um bombom do tamanho de uma ervilha. Chegou a 100. Quando sua boca se encheu, ela abriu e mostrou a língua coberta de bombons. Relatos fantásticos ou mitomaníacos?

Estórias piedosas, para arrebanharem à D'us as almas transviadas?

De 1913 a 1920, o Dr. Lupi, médico psiquiatra, acompanhou um caso de possessão de uma endemoninhada que bailava em ritmo de tango por horas, roía as roupas com os dentes, arrastava-se no solo como serpente, miava ou gania de forma assustadora. 

O caso é elucidativo porque foram taquigrafados na época os diálogos entre os exorcistas e o demônio, a qual anunciou que sairia do corpo da moça no dia 23 de junho de 1920. Nessa data, a possessa regurgitou vários objetos do tamanho de uma nós, e este tinha semelhança com um pedaço de carne com sete chifrinhos. Anos depois a ex-possessa gozava de plena saúde.

Mas esses casos dessa natureza, insólitos, presenciados publicamente, por especialistas, que se dão durante anos, o que quer dizer?

O melhor é confessarmos nossas limitações e ignorância e aguardarmos melhores esclarecimentos que não reduzam os fenômenos a meras categorias ou rótulos.

POSSESSÃO x PSICOSE

Ao estudarmos pormenorizadamente essas chamadas manifestações diabólicas, temos notado que há nelas um fundo comum maligno, perverso, vicioso e extravagante. O conjunto de fenômenos, ao mesmo tempo que mostra uma inteligência em ação, acompanha-se de vários fenômenos metapsíquicos: telepatia, clarividência, premonição, telestesia, levitações, etc. que a ciência, por mais descritiva que seja em relação ao contexto a qual esses comportamentos e fenômenos se instalam, não conseguem explicar na integra sua origem e finalidade.

De outro lado, há muito de puerilidade, quer na fenomenologia, quer no empirismo, nos estados histero-maníacos, nas dramatizações, e mesmo estados inconscientes. E por que não espirituais? Mas isso não nos compete ante a pluralidade humana e suas construções antropoculturais.

Perguntaram a um dos demônios de Illfurt, o que fizeram com Voltaire. Ele disse que o receberam em "grup-sessão" (neologismo para substituir a palavra procissão), rodearam-no e quando ele quis voltar para trás, forçaram-no, com gentileza a entrar no fogo. Quanto a Lutero, temiam que ele fizesse uma revolução com seus domínios, pelo que obrigaram-no a construir uma cabana na entrada do inferno!

Resta-nos a dúvida quanto a possibilidade de um esclarecimento do dinamismo do psiquismo à luz da psiquiatria, ainda que fenomenológica. Se pensarmos em psiquismo enquanto psicodinamismo, i.é., meio de ação da fenomenologia no campo das metacognições,  o fenômeno se tornará efeito e não tomado como causa, quando ele é simplesmente mecanismo, ao mesmo tempo.

A hipótese do inconsciente é válida e eficaz, de grande utilidade heurística, mas dá-lo características de onipotência e onisciência é anticientífico. Desta forma, realmente, explica-se tudo, mas não se refere a um lado vulnerável à experiência e contra-experiência. Se o fenômeno se dá, é o inconsciente que está agindo; se o fenômeno não se produz, o inconsciente não entrou em cena?

Dessa maneira, apenas substituiu-se o diabo medieval, pelo inconsciente. O diabo tudo pode: ler mentes, adivinhar, levitar, materializar objetos, tudo para se fazer perder os "justos".E no final dos tempos, haverá tantos prodígios, que até os escolhidos se perderiam, se isso fosse possível, segundo a Bíblia. 

Em meados de 1980, do findado século XX, 0 papa Paulo VI reafirmou com vigor a existência do demônio, ao pronunciar-se:

"A existência da  e a ação nefasta do demônio são coisas verdadeiras. Satanás - em que todo cristão deve acreditar, se não deseja comprometer a sua salvação - não é uma fantasia, mas uma pessoa verdadeira e real, invisível e tremendamente dinâmica!"
 (grifo nosso).


O ponto fraco da hipótese Diabólica é que um ser tão poderoso e inteligente possa dizer tantas bobagens e proceder, tantas vezes de modo tão ridículo e pueril. Contudo, achamos inútil perdermos-nos na discussão metafísica do diabo ou no seu aspecto teológico. 

Nosso Blogger não pretende ser um espaço exclusivo de discussão sobre demonopatia - indivíduos adoecidos que se julgam possessos pelo demônio, fruto de um transtorno mental, dos quais temos referências diretas. Nesses caso, trata-se de uma psicose e não possessão demoníaca. 

UM CASO DE PSICOSE?

John, oito anos, foi trazido a uma consulta por se queixar que via uma bola de fogo, a qual logo se transformava em diabo. Nesse delírio, o diabo o impedia de atos violentos contra o irmão mais novo. A anamnese revelou que John, aos dois anos de idade, teve meningite. Após obter as informações, foi solicitado um eletroencefalograma, que evidenciou uma lesão têmporo-parieto-occiptal.

Pouco antes do aparecimento das alucinações "demoníacas", o menino havia sido submetido a uma amigdalectomia e, possivelmente, o anestésico agiu sobre a lesão cerebral latente. Isso associado aos traços de personalidade, as questões próprias do ciúme reprimido contra o irmão mais novo, inferiu uma sintomatologia complexa, pelo qual, um cérebro lesado projetava alucinatoriamente e simbolicamente, de forma visual e auditiva, os impulsos reprimidos. Devidamente medicado e submetido à psicoterapia, toda a sintomatologia cedeu.

CONCLUSÃO

Percebe-se que, antes de admitir uma intervenção diabólica, como nos casos descritos nesse artigo, é preciso eliminar as causas mais comuns e naturais, i.é., psicopatológicas. A psicopatologia não exclui a fenomenologia metapsicológica (ou parapsicológica) e demonológica, bem como fenômenos psicopatológicos e metacognitivos.

Carl Jung, conta um caso, em seu livro Psicologia e Educação, de um menino que atirava facas e objetos contundentes num personagem que ele dizia persegui-lo. 

Schoenfeld, analista de comportamento,  afirma que só podemos tratar o comportamento religioso como um fenômeno puramente natural (e.g. Schoenfeld, 1993, pp. xxii; xxiii; 8; 10-11; 14.). Sob a ótica do behaviorismo radical, Schoenfeld, encerra a questão quando enfatiza que, embora o comportamento religioso varie, os princípios básicos que controlam o comportamento humano são os mesmos, e parte do trabalho de um analista do comportamento é identificar quais princípios gerais podem ser descritos para explicar uma grande gama de comportamentos específicos. Mas a fenomenologia, amplia este lugar de saber. 

A compreensão dos fenômenos mediúnicos como integrantes do universo cultural da sociedade passou a predominar nos discursos psiquiátricos carioca e paulista apenas na segunda metade do século XX. Em nossos dias a discussão continua e aberto à muitas abordagens que se sucedem, pairam as duvidas. 

Alguns fatores parecem ter colaborado para que isso ocorresse. O primeiro seria a opção do espiritismo de se legitimar primordialmente dentro dos domínios do campo religioso brasileiro, deixando de lado muitas das suas pretensões científicas. O segundo seria a obtenção da psiquiatria de uma maior consolidação no meio acadêmico, adquirindo respeitabilidades científica e social. 

Por fim, houve a adoção de uma visão antropológica, influenciada pela antropologia social, no trato das questões religiosas por parte dos psiquiatras. A religião começou, gradativamente, a ser vista como um possível agente colaborador no processo de tratamento dos considerados doentes mentais. 

Como analista de comportamento, mas visão de homem e mundo na dimensão fenomenológica existencialista, encerro este artigo com a reflexão de que cada comportamento religioso poderia ser analisado individualmente, e certamente apresentaria uma complexa combinação de contingências que o tornaria único. 

Sem a pretensão de exaurir o tema, procuramos descrever uma compreensão comportamental do fenômeno religioso, sujeita a aprimoramentos e análises mais aprofundadas. Se, como sugeriu Feuerbach: [...] ” a religião é o solene desvelar dos tesouros ocultos do homem”. Desta forma, cabe à ciência solenemente desvelar os tesouros ocultos da religião, mas jamais encerrar a questão!




Christianne Sturzeneker
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¹ -Vide ensaio Magia Antiga e Moderna IV : 
² - El Satanismo e la Magia . Ed. Saros. Buenos Aires, 1955.
³ - Maravilhamento.

Comentários


  1. Meu comentário

    Agostinho Ricardo Viana-Teólogo & Pesquisador Sócio-Cultural

    Tema da Pressão Demonico a Luz da Fenomenologia e Psicopatologia da CHRIS VIANA

    À forma como a Cris Viana, está desconstruindo a pressão do demônio, partindo do estudo da experiência subjetiva de consciência e a ciência natural, destinada à explicação causal dos fenômenos psíquicos, seguramente é um trabalho supra fantástico!
    É interessante a revelação que fazes, desde da viagem da peste diabólica, as suas origens já na Europa medieval, tal como os "feiticeiros e bruxos" nos séculos XVI a XVII. O diabo parece igual nesse século!!! E em todos os lugares! Nunca na história da humanidade, o diabo tomou tal proporção, embora tenha sido citado inúmeras vezes em outros livros, inclusive pela Bíblia Cristã; “Joao 8:44”
    Cris Viana, fizeste nos viajar, desde da Gênese de uma Denomina Coletiva, os Exorcismos, Possessão x Psicose? Um Caso de Psicose e Conclusão, aliado seu testemunho vivido em África, seguramente estão lhe dando esta competência em torno dos estudos de homilética, seguramente vai ajudar a calorificar estes fenômenos e cuidarmos deles ao mesmo tempo!





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